O Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação Social, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e o Instituto de Estudos Socioeconômicos ajuizaram no último dia 15 de maio uma Ação Civil Pública questionando o Decreto 9.759/2019, baixado pelo Presidente Bolsonaro em 11 de abril, por meio do qual estabelece a extinção massiva e arbitrária de centenas de colegiados relacionados com políticas públicas desenvolvidas por diversos Ministérios do Governo Federal e também revoga o Decreto 8.243/2014, que tratava da Política Nacional de Participação Social editado pela Presidenta Dilma Rousseff. O decreto põe em risco o cumprimento de políticas públicas relevantes para os brasileiros, tais como:
- Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade)
- Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT (CNCD/LGBT)
- Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti)
- Direitos do Idoso (CNDI)
- Transparência Pública e Combate à Corrupção (CTPCC)
- Segurança Pública (Conasp)
- Relações do Trabalho
- Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO)
- Política Indigenista (CNPI)
- Biodiversidade (Conabio)
- Comitê dos Usuários dos Serviços de Telecomunicações (CDUST)
- Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)
As entidades entendem que a extinção da Política de Participação Social é um erro grave, na medida em que afasta a sociedade da administração pública e, consequentemente, compromete atividades relevantes para o cumprimento de políticas públicas relevantes para o país.
A Coalizão Direitos na Rede publicou nota se pronunciou sobre o decreto, afirmando que “A medida é mais uma ação autoritária do governo de Jair Bolsonaro, que tem por objetivo impedir a participação social na definição e implementação de políticas públicas de interesse da população. Os comitês, conselhos e demais órgãos colegiados estão previstos na Constituição Federal de 1988 e têm por objetivo viabilizar o controle social para garantir direitos estabelecidos em diferentes âmbitos e garantir a participação social na criação de políticas públicas".
Apesar do caráter anti-democrático do decreto, em princípio, o pedido apresentado com a Ação Civil Pública se restringe a suspender os efeitos do Decreto 9.759/2019, até que se dê publicidade sobre quais órgãos da administração pública federal poderão ser afetados, pois, por incrível que pareça, a norma determina que em 28 de junho próximo devem ser automaticamente extintos centenas de colegiados, mesmo antes da divulgação de uma lista dando publicidade sobre quais organismos serão afetados. Por isso as entidades questionam o cronograma estabelecido com o decreto, que é irracional e afronta as garantias constitucionais de eficácia, publicidade e proporcionalidade das medidas da administração pública federal. O cronograma inverte a ordem do que seria razoável considerando-se uma medida com tamanho impacto:
11 de abril - Publicação do Decreto 9.759 28 de maio (art. 7º) - Prazo para envio à Casa Civil das propostas de recriação de colegiados, sem quebra de continuidade dos seus trabalhos 28 de junho (art. 5º) - Extinção dos colegiados de que trata o Decreto 1 de agosto (art. 9º) - Publicação dos atos, ou, conforme o caso, encaminhamento à Casa Civil das propostas de revogação expressa das normas referentes aos colegiados extintos 30 de agosto (§ 3º, do art. 8º) - Divulgação na Internet da relação de colegiados que o órgão ou a entidade da administração pública federal presida, coordene ou participe
A própria Casa Civil, por intermédio de Nota Técnica a respeito do decreto, destacou a importância de que os Ministérios envolvidos fossem previamente avisados, de modo que pudessem se organizar para cumprir o cronograma exíguo estabelecido com a norma e adotar as medidas necessárias para evitar o comprometimento da continuidade de atividades da administração federal.
Entretanto, não foi isso o que aconteceu. Tanto assim que na exposição de motivos, o Ministro Onyx Lorenzoni afirma que o Decreto 8.214/2014 é “verdadeiramente, uma aberração cuja revogação é urgente. Não foi sem motivo que o decreto tornou-se popularmente conhecido como Decreto Bolivariano”. Ou seja, o Governo ao editar o decreto tem motivação ideológica sem compromisso com a eficiência.
Mais ainda, a rapidez entre a reunião onde se decidiu pelo decreto e sua publicação, decorreram apenas seis dias, sob a justificativa ilegal de evitar a reação da sociedade e dos atores envolvidos, como se pode concluir pelo teor da Nota Técnica da Subchefia de Ação Governamental nº 67/2019/AS/SAGEP/SAG/CC/PR, da qual consta o seguinte:
_“não é possível deixar de ressalvar, o ineditismo da medida causará [sic], inevitavelmente certas dúvidas e perplexidades no âmbito da administração pública federal e que também convém alertar para a necessidade de os órgãos, autarquias e fundações pública [sic] serem alertados quanto à necessidade de propor rapidamente, atendendo todos os requisitos do decreto, a recriação dos colegiados a serem extintos que forem, realmente, necessários para a adequada ação administrativa” (...) 6. Quanto ao mérito, em que pese eventuais riscos na extinção de colegiados sem análise específica de cada um deles, cabe pontuar o seguinte. A estratégia de extinção em massa evita a resistência pontual dos membros de cada colegiado que seria extinto individualmente, o que facilita a implementação da medida de racionalização”.
Ou seja, o Governo está assumindo o risco de prejudicar a implementação de políticas públicas, com medida açodada e sem prévio estudo de impacto regulatório, contrariando os termos do Decreto 9.203/2017, que dispõe sobre a política de governança da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.
Foram essas as razões que revelam a urgência de que se suspendam os efeitos do Decreto 9.759/2019, que levaram as entidades a apresentar pedido de liminar, para que os colegiados não sejam extintos até que uma lista dos colegiados potencialmente afetados seja publicada. O Juiz da 19a. Vara Federal da 3a. Região em São Paulo, na sexta-feira dia 17 de maio, determinou que a União Federal seja intimada para apresentar suas justificativas no prazo de 72 horas.
Vamos ver se, pelo menos na Justiça, conseguiremos um pouco mais de transparência e racionalidade por parte do Governo Federal.
[Leia a íntegra da petição inicial aqui](Íntegra em PDF) Íntegra em PDF